Filosofia uma arte de viver
- Rodrigo Vinícius
- 3 de fev. de 2017
- 4 min de leitura

Para Hannah Arendt a busca filosófica é reveladora de um “coração compreensivo, e não a mera reflexão ou o mero sentimento”, além de ser – “uma atividade interminável, por meio da qual, em constante mudança e variação, aprendemos a lidar com nossa realidade, conciliamo-nos com ela, isto é, tentamos nos sentir em casa no mundo.” De modo, que a filosofia como busca amorosa do saber-se inteiro, do saber inteiro, funda uma arte do viver, a qual leva o filósofo – a não se calar frente ao mundo. Como diz Sautet – “Não é se dobrando sobre si mesmo que ele desempenha seu papel. É na rua, na cidade, misturando-se à vida de cada um, perambulando pela praça do mercado, no meio da multidão e dos que se divertem” – “É preciso aplicação, método, atenção, concentração, calma, mas também o inverso: o confronto com o real, a proximidade com a loucura, o afrontamento com aqueles que pretendem abusar dos outros. A meditação e a luta. O silêncio e o vozerio. A solidão e a ágora.” A pergunta se faz carne: não será fundamental cultivar essa busca amorosa, a filosofia, não como uma masturbação mental ou emocional, mas, sim, como uma elevação de consciência? Para entendermos e aprofundarmos esta reflexão caminhemos na Grécia antiga, na velha Roma e na adorável Índia. Um breve passeio pela sabedoria da antiguidade, caminhando com os mestres.
Para o mestre ateniense Sócrates - "A vida que não é examinada não vale a pena ser vivida." O filósofo grego morto por sua ousadia frente a loucura de um mundo corrupto, cego e hipócrita, levantou sua voz à confusão reinante e proclamou a necessidade do homem se autoconhecer, trilhando o caminho labiríntico de descoberta, do que o psicólogo Jung chamou no século XIX de SI-MESMO. Descobrindo a si mesmo o homem descobre o microcosmo que é sua alma, como quem perscruta uma gruta de diamantes na noite úmida da terra.
Outro ramo de seiva saborosa e cheia do licor da sabedoria, Epicuro convidava o homem a perceber que – "É vazio o argumento do filósofo que não alivia nenhuma aflição humana." – "Quanto às Doenças da Mente, a Filosofia lhes ofereceu Remédios; sendo, nesse aspecto, justamente considerada a Medicina da Mente." – "Somente a Razão torna a vida alegre e agradável, excluindo todas as Concepções ou Opiniões falsas que podem perturbar a mente." – O mestre do jardim exortava o homem a se tornar saudável como forma de alcançar a felicidade. Caminho que passava pela filosofia, medicina para a alma enferma, afinal sua enfermidade consiste em estar privada de Consciência, precisando, portanto, de ventilar a mente e o emocional com a claridade e o frescor da filosofia.
E para os que desconhecem... Pitágoras, um grande mestre já ensinava que – "Nenhum homem é livre se não puder comandar a si mesmo." E comandar a si mesmo era estar livre do apego, assim como ensina outro mestre, Epictetus – "Se sempre acontece de você se voltar para o exterior querendo agradar a outra pessoa, certamente você perdeu o seu plano de vida." – Pois procurar agradar a outrem é buscar respaldo ou base para si na apreciação alheia, alienando o processo de ser. E é preciso ter cuidado com a mente, esse instrumento refinado e sagaz, e por isso diz Platão – "A melhor coisa em relação à minha arte é que ela pode testar de todas as maneiras se a mente... Está produzindo uma mera imagem, uma impostura, ou um fruto verdadeiro e genuíno."
E mesmo passado séculos de distância Marco Aurélio, o imperador romano, vislumbrou com sabedoria – "O tempo da vida humana não passa de um ponto, e a substância é um fluxo, e suas percepções embotadas, e a composição do corpo corruptível, e a alma um redemoinho, a sorte inescrutável, e a fama algo sem sentido... O que, então, pode guiar o homem? Somente uma coisa, a filosofia."
Na Índia do século VI antes de Cristo vivia um sábio, Buda, que com amor ensinou – "O carpinteiro molda a madeira; os arqueiros moldam flechas; o sábio molda a si mesmo." –
Os exemplos poderiam prosseguir e colheríamos frutos de polpa doce na vastidão do coração humano. Não nos parece proveitoso, contudo, deixar de lado a compreensão do que foi claridade em nossa modernidade, por isso caminhemos com alguns ramos frutíferos deste jardim chamado filosofia.
Thoreau, o filósofo americano espelhando o pensamento pragmático ensinava com propriedade, inclusive, através de seu modo de vida. Ele disse – "Ser filósofo não é meramente ter pensamentos sutis, nem mesmo fundar uma escola... É resolver alguns dos problemas da vida, não na teoria, mas na prática."
Irís Murdoch adentrou a profunda força aquosa do ser humano – "Fazer filosofia é explorar o próprio temperamento e ao mesmo tempo tentar descobrir a verdade."
E para arrebentar com todo o edifício de simulacros a dinamite chamado Nietzsche – "Filosofia, como até agora a entendi e vivi, é a voluntária procura também dos lados execrados e infames da existência. Da longa experiência, que me deu uma tal andança através do gelo e do deserto, aprendi a encarar de outro modo tudo que se filosofou até agora: - a história escondida da filosofia, a psicologia de seus grandes nomes, veio à luz para mim. ‘Quanto de verdade suporta, quanto de verdade ousa um espírito?"
Os caminhos da vida são sinuosos e espinhosos. A vida encontra sua perfeição na completude de suas oposições. Toda a filosofia da antiguidade e quiçá alguns exemplares mais selvagens da modernidade clamaram para que o homem aprendesse a arte de viver. A arte de viver, não como um manual ou formulário protocolar, um padrão ou uma uniformização, que vemos hoje em uma de suas formas no conceito de – politicamente correto, mas como uma iluminação, um pico, uma elevação rumo às estrelas, uma dança amorosa com a vida, fazendo-se um só com o Todo. O voo de uma borboleta no verão da vida. A filosofia é um convite a cultivar um jardim de atributos dentro de cada um de nós.
Rodrigo Vinícius
Graduando em Letras Clássicas pela UFPB
rodrigovs_8@hotmail.com
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