Os antecedentes da Guerra de Troia
- Nedja Alves
- 7 de fev. de 2017
- 5 min de leitura
Para que consigamos entender bem tudo o que aconteceu em Troia, o porquê da guerra, precisamos entender alguns pontos da sociedade grega da época. Primeiro temos que ter em mente o senso de coletividade da sociedade grega que não admitia uma individualidade dos homens e mulheres, sobretudo dos de destaque social, ou seja, uma vez que uma pessoa influente dentro da sociedade cometia uma hybris, toda a coletividade seria considerada impura pelos deuses e sofreria as consequências deste ato até que esta impureza fosse expurgada da polis através de alguma punição ou sacrifício de expiação.
Hybris é o que os gregos entendiam por tudo o que passa da medida, ou seja, que não estava de acordo com o metron. O que escapava do meio termo. Aristóteles diz que hybris é o desprezo que alguém tem pelos outros e/ou pelos deuses a ponto de fazer o que bem entende sem se preocupar.
Precisamos entender ainda que o termo polis para eles não está relacionado diretamente ao local onde habitam, mas mais profundamente a população que habita o local. A polis, na verdade, é conjunto dos polites (cidadãos). A polis está onde todos os polites estão. E, por fim, é bom que saibamos que existia entre os homens e os deuses um código de paz mandado por Zeus que não poderia ser quebrado de maneira nenhuma chamado "Lei da Hospitalidade". Essa lei consistia em receber bem qualquer estrangeiro que lhe pedisse abrigo oferecendo-lhe comida, e uma boa cama, além dos confortos de sua casa. Ao hóspede cabia não abusar da hospedagem respeitando a casa em que estava, seus bens e os que lá viviam; deixar presentes, se possível e de lá não levar nada que não lhe fosse dado.
Voltando a Tróia: ela estava fadada ao fim. Em seu caso, muito antes de Helena cruzar seus portões com Páris reforçando perante os deuses a impureza dos descendentes de Tros e virando o estopim da guerra que destruiria a cidade, Laomedonte já a condenara ao cometer a hybris de não pagar a Poseidon e Apolo pela construção dos muros da cidade. Para salvá-la da praga enviada pelos deuses, ele teve que sacrificar uma de suas filhas, a qual Héracles pediu uma recompensa para salvar e o Basileu concordou, a moça foi salva, mas a hybris contra os deuses não foi expurgada, pois também desta vez Laomedonte não cumpriu com sua palavra e não pagou pelo resgate, cometendo hybris novamente. Por esse motivo, Héracles matou a Laomedonte e todos os seus filhos, com exceção de Príamo que governou posteriormente.
Vamos aos antecedentes da guerra: Zeus metamorfoseado em cisne seduziu Leda de Esparta, esposa recém casada de Tíndaro. Leda então chocou dois ovos de onde saíram quatro filhos, dois semidivinos filhos de Zeus, Helena e Polux e dois normais filhos de seu marido, Clitemnestra e Castor. Os quatro de grande beleza, destacando-se dentre todos, Helena, a mulher mais bela dentre todas as mulheres, a qual ainda criança foi raptada pelo herói Teseu para tornar-se sua esposa, porém seus irmãos saíram em sua procura e auxiliados por Academo conseguiram resgatar a jovem. Ao crescer a moça tinha vários pretendentes e, entre eles, vários dos grandes heróis do seu tempo, mas seu pai adotivo, por medo de desagradar tais homens tão
fortes e poderosos, não se decidia em entregar sua mão a nenhum deles até que Odisseu sugeriu a todos de deixar que a própria donzela escolhesse seu marido e, para evitar novos raptos, fez com que todos os pretendentes prometessem proteger a união de Helena e seu escolhido. A donzela, então escolheu a Menelau, rei da Lacedemônia e irmão mais novo de Agamenon.
Enquanto essas coisas aconteciam em Esparta, em Tróia, nasce Páris. Um dos filhos mais novos de Príamo e Hécuba, o qual em virtude do seu nascimento, sua irmã Cassandra prevê que aquela criança traria à cidade uma guerra tamanha que a incendiária e a destruiria completamente. Preocupado com o destino de Tróia Príamo manda abandonar a criança nas proximidades do monte Ida para que fosse devorada pelos lobos, mas o bebê é encontrado por pastores que o salvam, o criam e ensinam a pastorear. Pela ascendência real ser evidente, apesar de desconhecida, e por fazer julgamentos justos e bons os pastores chamam o menino Páris de Alexandre, que significa defensor dos homens. Outra versão da história diz que o bebê é entregue a pastores que habitam as proximidades do monte. De qualquer maneira, ali cresceu Alexandre pastoreando, sem saber quem realmente era, casa-se “informalmente” com uma ninfa chamada Enone e vive sua vida feliz e tranquila.
Quando Alexandre era ainda muito jovem e pastoreava, antes de encontrar Enone e viver sua tal felicidade ao pé do monte Ida, casavam-se na Ftia Peleu e a deusa Tétis, pais de Aquiles. No dia da celebração do casamento, Zeus dá um banquete do qual deixa de fora da lista de convidados, Eris, a deusa da discórdia, que, irritada com a desfeita do Cronida, joga entre Atena, Hera e Afrodite um pomo dourado onde se lê “para a mais bela”. O pomo logo vira objeto de desejo das três e, por causa disso, começa imediatamente uma disputa entre as deusas para saber qual delas é a merecedora do prêmio tão cobiçado.
Sem querer se comprometer com essa competição, Zeus o Pai dos deuses e dos homens, indica Páris como juiz da querela das divinas, dizendo ser aquele o mais justo entre os homens, capaz de julgar a beleza das deusas e premiar uma delas. Na intenção de persuadi-lo, cada uma das candidatas a merecedora do Pomo da Discórdia prometeu ao pobre juiz um prêmio em troca da vitória: Atena o oferece o dom de ser o mais sábio dos homens, mais até que alguns dos deuses. Hera o oferece a chance de ser um rei extraordinariamente famoso e poderoso. Afrodite por sua vez, o oferece a mulher mais linda do mundo, que é Helena, como esposa, mas não o informa que a bela, a essa altura, já está muito bem casada com Menelau e tem sua união protegida por todos os Basileus da Grécia por juramento. Jovem, inocente de sua verdadeira identidade e cobiçoso do amor da bela moça prometida pela deusa, Alexandre/Páris não tem dúvidas ao escolher imediatamente Afrodite como vencedora.
Tempos depois, o rapaz, já desposado da ninfa e ainda desconhecendo o seu passado, volta a Troia para participar dos jogos a fim de conseguir prêmios para a sua família de pastores - ignorando os pedidos de Enone de que não fosse, pois não retornaria e a abandonaria -, chegando lá, vence os jogos ganhando de todos os competidores, inclusive de seu irmão mais velho Heitor, e é imediatamente reconhecido pelo pai que o leva de volta ao lar junto com sua esposa ilegítima. Passado algum tempo de seu retorno, Heitor leva Páris em uma expedição à Esparta onde ele finalmente encontra seu prêmio prometido por Afrodite e, indo completamente contra a lei da hospitalidade, leva muitas riquezas do palácio de Menelau e rapta sua esposa Helena. Ao retornar com a noiva raptada, ao invés de ser repelido para fora dos muros de Troia, é recebido por seu pai Príamo que mancha mais uma vez a cidade com a hybris, dessa vez, a do filho, atraindo os exércitos gregos e cumprindo o destino visto por Cassandra no fatídico dia do nascimento de Páris. Delenda est Troia.
Referências bibliográficas
ALVES, M. (2012). “O Humano em Homero”. Archai n. 8, jan-jun 2012, pp. 39-46.
ARISTÓTELES, Retórica, Editora Edipro, 2011.
Grimal, Pierre, Dicionário da Mitologia Grega e Romana, Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil
Alcinedja Alves
Graduanda em Letras Clássicas pela UFPB
nina.alves93@hotmail.com
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